Desembargador Dr. Sylvio Capanema de Souza em entrevista ao jornalista Reinaldo Wolff
Momento de grande alegria reencontrar o Dr. Sylvio! Considerado uma das mais ilustres autoridades do Direito Brasileiro, conhecido até mesmo como o Papa do Direito Civil, é especialista em Direito Imobiliário.
Em entrevista exclusiva à Equipe Wolff, ele narra neste diálogo, sua experiência de vida, como juiz, desembargador, professor universitário, conferencista e escritor.
Desde que o conheci num congresso imobiliário em 2001, percebi sua personalidade brilhante, cuja característica principal é o tocante sentido humano com que faz suas palestras, com pitadas hilariantes através de suas narrativas, sem perder a simplicidade, mesmo tendo chegado ao topo tão almejado por tantos no Brasil.
Assim sendo, aqui nos conta a sua experiência de 58 anos de atividades jurídicas.
Acompanhe a sua entrevista na íntegra:
Reinaldo Wolff: Eu admiro a pessoa que chegou ao topo da carreira – e que ainda mantém a humildade... Porque uma grande parte das pessoas - chegou ao topo - e tem uma empáfia! O senhor sabe disso.
Dr. Sylvio: É, sem dúvida, concordo.
RW: E o Dr. Sylvio em suas palestras nos congressos emocionava as pessoas. Eu me lembro dos congressos que assisti. Ele fazia a plateia chorar de emoção. E dali a pouco, estavam todos rindo das piadas... Ele falava coisas emocionantes, que mexiam com as emoções das pessoas.
Dr. Sylvio: Eu falo com o coração.
RW: É isso mesmo - fala com o coração!
Dr. Sylvio: Mas como é que vocês querem fazer a entrevista? Preferem fazer as perguntas e eu mando a resposta?
RW: É um diálogo bem espontâneo. Dr. Sylvio, como é que chegou a ingressar na área de Direito? Como surgiu a ideia de estudar Direito?
Dr. Sylvio: Bom... eu era aluno do Colégio Militar - e tinha todas as possibilidades de seguir a carreira militar. Mas já nos dois últimos anos do meu curso, eu comecei a perceber a importância do Direito para o equilíbrio social. E tinha também um tio muito próximo que era advogado, e então aprofundei essa averiguação quanto à melhor carreira a seguir... e convenci-me, felizmente, a fazer o vestibular para a Faculdade Nacional de Direito. Embora a minha família, por parte de pai, seja toda dedicada à Medicina. Meu avô, meu pai e meu irmão – eram médicos! Mas hoje eu me sinto muito bem por ter feito essa opção, à qual eu dediquei toda a minha vida. Completo este ano, 58 anos ininterruptos da minha vida, dedicados ao Direito e à Justiça. Seja como advogado militante, seja como Desembargador – (mas representando o Quinto Constitucional da Advocacia), e seja como Professor de Direito Civil. O que exerço também há 50 anos ininterruptos!
RW: O senhor ainda dá aulas de Direito?
RW: O senhor ainda dá aulas de Direito?
Dr. Sylvio: Ainda dou aulas!
RW: Onde?
Dr. Sylvio: Na Cândido Mendes e na Escola da Magistratura, no Rio de Janeiro. Além do que eu também dou aulas na Pós-Graduação da Fundação Getúlio Vargas e da PUC.
RW: Dr. Sylvio, como é que é a carreira para os que pretendem ingressar nela?
Dr. Sylvio: No momento, a carreira é extremamente desafiadora. O mercado é quase predatório. Há um número muito elevado de advogados. Nem sempre formados o suficiente... Vivemos numa crise sem precedentes, na minha opinião. E que fez com que os mercados econômicos entrassem em grande depressão! Nós temos aqui, no meu escritório, percebido e vivido essa situação. Há uma retração enorme econômica, social e ética! E a área em que eu atuo preferencialmente, sempre foi o Direito Imobiliário – setor que mais sofreu em meio a essa crise. Várias clientes nossas, incorporadoras, estão enfrentando enormes dificuldades há cerca de três ou quatro anos, e algumas delas, infelizmente, sucumbiram! E outras estão resistindo estoicamente. Mas, começa a surgir uma esperança no horizonte, de uma recuperação! O que também dependerá muito do resultado das eleições! O mercado aguarda, muito ansioso, o resultado das eleições. Quando mais não seja, para pacificar o país, e permitir a retomada do desenvolvimento.
RW: Eu não sei exatamente como o senhor pensa nesse sentido, mas lá em casa nós somos Pró-Monarquia, nós somos a favor do que houve no Partido Moderador. Entendo que a única forma de dar jeito no Brasil é pela ponderação! Onde dá oportunidades a quem precisa – e protege o empresariado para que ele não seja avassalado por situações que lhe criem – dificuldades e até a derrota daquilo que está fazendo... Então, nós encaramos assim dessa forma. E como o senhor vê essa situação toda?
Dr. Sylvio: A minha mãe era uma monarquista convicta! Ela inclusive participava de movimentos monárquicos! E tinha o prazer, e a honra, de ter convivido em algumas situações sociais com os herdeiros. E eu tenho, então, essa formação familiar Pró-Monarquia! No Plebiscito que houve, no qual eu participei, confesso que votei pela República... achei que nós, naquele momento, estávamos já muito mais identificados com o Regime Republicano. Não sei se hoje o resultado do Plebiscito seria o mesmo! Porque é inegável que nós não temos uma certa vocação Republicana – no sentido do preenchimento dos requisitos – principalmente: morais que este sistema exige.
RW: É necessário fazer uma mudança aos moldes mais antigos.
Dr. Sylvio: Sem dúvida!
RW: Porque é necessário conservar família, conservar o patrimônio. Por exemplo, mandei para alguns amigos, e um deles não gostou daquele vídeo que eu mandei, de algo que havia recebido em que um senhor do PT do Piauí estabeleceu condições de 700 reais por mês. E quem ganhasse a mais, este seria um empréstimo solidário ao governo, para ser devolvido depois de sete anos, ao longo de quatorze anos... então é radical demais para ser aceito!
Dr. Sylvio: Eu comentei hoje, por coincidência, que a reação positiva à candidatura Bolsonaro, nos últimos 4 dias, na minha opinião, se deve à exposição excessiva do PT e da esquerda, divulgando a imagem do Lula. E, principalmente, as manifestações do #EleNão e as Paradas Gays - em que tanto se enfatiza valores que são completamente contrários à tradição da Família Brasileira. E eu tenho a convicção de que a grande maioria dos brasileiros ainda é conservadora, e ficou horrorizada diante dessas imagens! Assim, penso que muitos que ainda estavam em dúvida, acabaram se convencendo a votar no Bolsonaro - não por ser a melhor solução - ao contrário, eu tenho um enorme temor com o que possa acontecer com a Presidência Bolsonaro. Mas, no momento, a grande parte dos brasileiros, que preserva esses valores éticos, acha que é um mal menor. E que "É preciso frear, a qualquer custo, o avanço desse tipo de pensamento libertário - e que não é nem libertário - é anárquico e imoral"!
RW: Imoral e que destrói as famílias, e destrói a propriedade.
Dr. Sylvio: Sem dúvida!
RW: A gente vê a história de Fênix, na mitologia, e vê a sociedade - às vezes parece-se com uma Fênix. Pois chega a um momento em que ela gerou um caos absoluto, e de repente começa a ressurgir e a renascer.
Dr. Sylvio: Isso, exatamente.
RW: O senhor acredita nesse retorno ao sistema antigo?
Dr. Sylvio: O avanço dessa esquerda, que é no sentido de destruir esses valores, finalmente parece que "acordou" a chamada "maioria silenciosa". E nos convencemos que é preciso reagir a isso. Porque, senão, vamos todos sucumbir!
RW: Inclusive pela insegurança jurídica...
Dr. Sylvio: Sim!
RW: Causada por tantas emendas à Constituição.
Dr. Sylvio: Sem dúvida!
RW: Porque há necessidade de um nortear, diante de tudo isso.
Dr. Sylvio: Acredito que já é o momento de uma nova consulta à sociedade, não digo necessariamente quanto à volta da Monarquia, mas pelo menos quanto à consulta no sentido de que "o que é preciso mudar, realmente", porque prosseguir nesse caminho que estamos, infelizmente, hoje envolvidos - é um suicídio! Tanto histórico, moral, e social.
RW: Agora, Dr. Sylvio Capanema de Souza, por gentileza, fale de seus congressos, seus livros e as coisas que o senhor tanto ama de ter feito.
Dr. Sylvio: Bom, nós temos procurado contribuir dentro das nossas modestas possibilidades, para o desenvolvimento da cultura jurídica brasileira. Como eu lhes disse, dedico mais de cinquenta anos, ininterruptos, ao magistério de Direito. Formei, portanto, incontáveis gerações de advogados. E sempre tentando incutir-lhes a certeza de que o único caminho para o equilíbrio social é através do Direito, e da Justiça. Portanto eu tenho me esforçado, dentro das minhas possibilidades, para preservar estes valores! Compareço frequentemente a Congressos. Tenho peregrinado pelo Brasil, literalmente, do Amapá ao Rio Grande do Sul, tentando convencer, principalmente, aos jovens advogados, da importância de ser advogado hoje, no Brasil. Eu acredito que só a geração de advogados de 1824 - e isso interessa muito a vocês que são monarquistas. Só a geração de advogados de 1824 teve a mesma responsabilidade histórica da geração de hoje! Porque os advogados de 1824, todos eles formados em Lisboa, em Coimbra ou em Paris. Não havia faculdades de Direito no Brasil! Apesar de se formarem no exterior, eles sempre se sentiram 'verde-amarelamente' brasileiros... E fizeram uma Constituição tão perfeita, mas tão perfeita, que conseguiu preservar a unidade territorial do Brasil. Enquanto toda a Europa, toda a América do Sul espanhola, fragmentou-se! Então essa Constituição Imperial manteve a unidade territorial do Brasil e criou um país, sem nenhuma experiência anterior, e nem nada. Então eu penso que a atual geração é que tem uma responsabilidade histórica igual. Porque, enquanto aqueles construíram o Brasil, nós vamos ter que reconstruí-lo! Porque nós o destruímos, no ponto de vista ético!
RW: Acredito que isso se consegue com a valorização das pessoas que são inteligentes no país. Porque muito se fala do deficiente (no sentido deficiência física ou mental). Mas pouco se fala em valorizar a inteligência, nesse país.
Dr. Sylvio: Claro!
RW: E o senhor vê que é curioso - a pessoa inteligente sente como se fosse uma sede... ou fome de conhecimentos! Onde sua mente, sua capacidade intelectual, se expanda! Como eu vejo quanto que o senhor estudou, quanto que o senhor fez. Não estou bajulando, estou sendo sincero! Então, essa sede, essa fome de conhecimentos, vem pelo QI que a pessoa tem. Não acha necessário a sociedade valorizar os gênios que tem?
Dr. Sylvio: Mas é evidente! Qualquer país do mundo vive isso. E a cada entrega de um Prêmio Nobel a gente verifica isso - a importância do estudo, da pesquisa, da Ciência. E acho que o Brasil negligencia muito quanto a isso.
RW: E quais são os livros que o senhor fez?
Dr. Sylvio: Eu tenho cerca de uns dez livros, já. Tenho livro sobre a legislação do inquilinato, que eu ajudei a construir. Eu fui um dos membros da comissão designada pelo governo, para elaborar o anteprojeto da atual Lei do Inquilinato. Então eu tenho dois ou três livros sobre esse assunto. Tenho um livro sobre os Comentários do Código Civil de 2002. Tenho um livro sobre Condomínio e Incorporações, atualizando o livro clássico do Prof. Caio Mário. E tenho também um livro sobre Direito Internacional Privado. Então tenho tentado contribuir também para a Cultura Jurídica Brasileira.
RW: Com certeza! E de tudo isso que o senhor viveu, o que mais lhe emocionou de toda a sua carreira, que o senhor possa nos trazer assim como um fator humano, para que motive outras pessoas a estudar.
Dr. Sylvio: Como professor, o salário indireto dos professores é ver os seus ex-alunos vitoriosos! Por exemplo, por incrível que pareça, já tenho um ex-aluno Ministro do Superior Tribunal de Justiça. O Ministro Bellizze foi meu aluno no curso de bacharelado na Universidade Cândido Mendes. Tenho inúmeros ex-alunos Desembargadores, Magistrados... E essa é a grande emoção que nós, professores, temos ao ver que contribuímos, efetivamente, para a criação de uma geração compromissada com esses valores éticos que nós sempre defendemos. No ponto de vista de advogado, também são importantes algumas vitórias que tivemos defendendo teses que não são apenas jurídicas, mas também éticas. E, nesse ponto, também nos sentimos realizados! Estou com oitenta anos, mas continuo advogando... Estou aqui, no meu escritório, nesse momento, para exercer a função de advogado, já que me aposentei como Magistrado. E por isso penso que não podemos desistir! Aqueles que estão comprometidos, como eu, com o futuro do país, não podem desistir! Ir até o fim na defesa de seus ideais!
RW: Não seria a hora do país defender melhor seus escritores? Como por exemplo, nossa mãe foi escritora. O problema, que deu uma grande tristeza no final da vida dela, é que registrou em marcas e patentes uma cartilha de alfabetização e ficou anos e anos para obter resposta. Quando deram a resposta, disseram que ela tinha perdido o prazo! Não é a hora de fazer uma revisão nessa questão de direitos e defender melhor os escritores e os intelectuais que verdadeiramente amam esse país?
Dr. Sylvio: Na verdade, há toda uma legislação de proteção aos direitos imateriais e direitos de autor, mas que nem sempre é diligentemente cumprida! Mas a preservação da Cultura Nacional é fundamental para qualquer país que se diga "civilizado".
Dr. Sylvio: A primeira de todas é - não deixar de sonhar. Porque o sonho é o combustível da alma. Principalmente dos advogados. É preciso que a gente se comprometa, ainda que através do sonho, com "o tempo melhor", "uma sociedade mais justa e fraterna". Em segundo, estudar permanentemente. Eu posso garantir que aos 80 anos, 58 anos de formado, eu talvez não passe um dia sem estudar Direito. Até porque Direito, hoje, é extremamente dinâmico. E se nós pararmos no tempo, no estudo do Direito, nos defasaremos em seis meses! Então é raro o dia em que eu não leia um Acórdão do Supremo, do Superior Tribunal - ou não leia um artigo jurídico. É, então, uma recomendação fundamental para os novos advogados. Se há uma profissão que exige, de quem a exerce, um compromisso diário com o estudo é o Direito!
Martha Wolff: Pensa-se que é a Medicina, mas é também assim com o Direito!
Dr. Sylvio: Ali a placa do consultório do meu pai! Que eu já lhes falei, que era médico. Essa placa é da década de 40, quando ele começou a praticar e exercer a Medicina. E o meu irmão, que também era médico, recebeu essa placa, após a morte do meu pai, como lembrança. E como meu irmão também morreu, agora eu então herdei a placa e fiz questão de exibi-la aqui no meu escritório, para fazer uma homenagem ao meu pai.
RW: Nós acreditamos na vida após a morte. Penso que a vida não se restringe só aqui.
Dr. Sylvio: Claro!
RW: Deus, com sua Infinita Sabedoria, age para de alguma forma conservar o que foi criado por Ele. O senhor concorda?
Dr. Sylvio: Claro, sem dúvida! Eu sou católico praticante. E também acredito na vida após a morte.
RW: Eu tenho essa convicção e certeza interior. E uma das formas de as pessoas continuarem, é através de suas obras. Estas são eternizadas para as futuras gerações. E isso o senhor com certeza contribuiu muito!
Dr. Sylvio: Muito obrigado!
RW: Eu sou fã número um do senhor.
Dr. Sylvio: Fico muito sensibilizado e agradecido.
RW: A Equipe Wolff agradece e fica honrada com a sua entrevista.
Dr. Sylvio: Eu que agradeço, não esperava esta homenagem. Vou levá-los até a porta.
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