O Mordomo do Imperador - Autor Américo L. Jacobina Lacombe - Biblioteca do Exército Editora - Parte II


...E se encantou com a vida na Corte! As mulheres bem vestidas, a alta sociedade, o modo refinado de falar e o conviver nas festas da Realeza – tudo contribuiu para o clima de encantamento ao jovem recém vindo. E por quê? Ele já foi criado em ambiente de riqueza. Ele já impregnava dentro de si o modo de ser de um homem rico. Aquela vida restrita de interior, para ele não estava certo! Mas ao chegar no Rio de Janeiro, saindo da casa da fazenda de seu pai sentiu o primeiro choque emocional – ter que morar num “porta e janela”! E mesmo assim o soldo não dava para pagar! (É isso que também acontece no século atual, em nossas épocas de grande inflação no país, em que o ordenado recebido pelo recém formado militar torna quase impossível pagar um aluguel e mais as despesas para sobrevivência. São os momentos mais duros de suportar – e é isso que aconteceu para ele em plena época imperial!).
Entretanto, procurando pelas influências e amizades de seu pai na corte, conseguiu descobrir um antigo amigo da família que o hospedou durante 3 anos!
Nessa época foi designado, devido a todas aquelas referências dos superiores, a acompanhar a comitiva quando o Rei saía a passeio para regiões afastadas do Palácio.
Acontece que o Rei gostava de ir conversando, inclusive com os soldados. Para o espanto e desafio de etiqueta para os fidalgos que o acompanhavam. O jovem oficial ia de longe observando as maneiras de se comportar nos protocolos da corte. Embora, em cartas ao irmão, revelava-se espantado com atitudes do cotidiano do Rei. Que a um jovem fazendeiro do interior de Minas, considerava escandalosos. Sem mencionar a que se referia. Aos poucos foi aprendendo as boas maneiras da corte. 
Um dia, seu cavalo emparelhou-se à comitiva mais próxima do Rei, que com ele conversou animadamente. Com o inesperado, ele confundiu-se e respondeu “Sua Senhoria”. Foi imediatamente repreendido pelo erro de tratamento “Sua Majestade”. E qual não foi sua surpresa – o próprio Rei foi em sua defesa. Este foi o primeiro dia que ele serviu perto do Rei. Talvez devido a este incidente da “Senhoria” o Rei tenha marcado a presença dele. E o que mais impressionou foi verificar que o Rei era extremamente cumpridor de seu ofício – uma vida metódica, o Rei acordava às 6 da manha e já ia despachar até às 10 horas. Lia todos os documentos que ia assinar. Tinha uma memória perfeita sobre o andamento de todos aqueles assuntos. De novo, à tarde, despachava por horas. E só depois é que saía a passear. Então não era um Rei maluco, alheio às questões do Reino. 
A mulher do Rei era absolutamente histérica, e os filhos pequenos agitadíssimos. Quem eram os filhos? Dom Pedro I e as irmãs. Criancinhas levadas, diríamos hoje. Para eles, naquela época, representavam: maus modos. Criança que sai correndo não sabe bem ainda os protocolos, faz travessuras, quer brincar. 
Observando tudo e todos, o tenente foi aprendendo os “modos de Corte”. Então, com influência de muito dinheiro no início da vida, e sabendo se comportar em sociedade, após as missões que se seguiram ao Levante de Pernambuco, ao voltar, ele queria uma premiação. Não deram. Porque o governo estava em transição, não tinha dinheiro. (Estava uma época do jeito agora com a Dona Dilma: “Não tenho!”). 
Aí foi comissionado a tarefas cada vez mais importantes. Resolvendo o melhor possível, na volta pedia ao seu comandante o documento comprovando a tarefa recém cumprida. A seguir, ele requeria uma comenda, para o adorno do ombro. O militar tem isso, a cada feito significativo, põe a referente condecoração para constar no uniforme, uma medalha ou o que! Quando alguém chega na frente de uma militar Comandante, ele tem todas as suas premiações de condecorações, medalhas, expostos no uniforme. Quanto mais medalhas, mais respeito e admiração recebe de todos. 
Ele tentou por quatro vezes as tais merecidas condecorações e não conseguiu nenhuma. Um dia voltou pensativo para casa. Comprou um lanche – naquela época era um pão com manteiga... E esse pão veio com um papel com alguma coisa escrita. Ele sentou, ficou saboreando, pensativo, a refeição e foi ler. E no papel constava uma lei! Era o seguinte: filho de alguém que tenha sido um benfeitor do país, terá direito a uma dotação em dinheiro (valor alto!) Ah... Na mesma hora ele voltou para Minas, nas fazendas do pai, pegou todos os testemunhos que o pai tinha doado muito minério, e muito dinheiro, para o Governo no tempo da guerra. Pegou as provas, entrou novamente com o requerimento. E dessa vez, o Rei escreveu no papel “Sim”! E ele conseguiu um dinheirão! A seguir, comprou a patente e foi se aproximando mais da cúpula da corte. De tal modo, que quando Dom João VI foi embora, ele foi designado “Mordomo da Casa Imperial”. É quase uma espécie de “Ministro de Finanças” de hoje. Todo dinheiro da Casa Imperial estava sob o controle dele. E se tornou o homem mais poderoso do Império, até a maioridade de Dom Pedro II. A ponto de surgir no meio do povo o comentário maldoso, mas tão forte, que chegou ao nosso conhecimento neste século: “Paulo, primeiro. Pedro, segundo”. Bem chocante e traumática deve ter sido essa frase para o jovem Imperador D. Pedro II. E a verdade era esta – o controle do dinheiro estava na mão do Mordomo. O próprio Dom Pedro II andava sem dinheiro nenhum. Todo e qualquer pagamento era no âmbito das tarefas do Mordomo Paulo. E o Rei nem foi criado com a noção de dinheiro. Tinha lá suas despesas e o Rei dava ordens de mandar pagar. 
Com um detalhe importante a considerar – o autor se refere ao seu biografado da seguinte maneira: militar corretíssimo, de família rica do Brasil. E que ele não foi intrigante e sempre foi correto. Com o maior poder possível. Maior que o dele, só o Mordomo Mor José Bonifácio. Ele aprovava ou não aprovava os pagamentos a serem feitos. E o Rei querendo? Aí ele mandava pagar. Mas e as influências para o Rei querer? Aquele jogo de influências acontecia mais no Sítio que se diz ao lado de um rio chamado Joana. Era a casa da Joana. Ali se reuniam e se decidiam muitas coisas. Expressão que hoje muitos ainda conhecem como dito popular “Pensa que aqui é a Casa da Joana?..”


Veja a parte 1 aqui:

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