Entrevista exclusiva de Indiara da Silva Nunes à Equipe Wolff
Voluntária em Angola
"Meu nome é Indiara da Silva Nunes. Tenho 23 anos. Moro na Bahia, em Capuiruçu, Cachoeira. Estudo fisioterapia. Estou no 3º de faculdade. E quero trabalhar como voluntária em Angola - ou qualquer outro país que necessite de voluntário."
Projeto A Voz do Povo © Equipe Wolff
Reinaldo Wolff: Como é que veio essa idéia de ser voluntária?
Indiara Nunes: É assim, eu cresci no sistema de educação de igreja. Tem sempre as cartas missionárias. E desde criança eu gostei de ver e ouvir as histórias das pessoas, das vidas que eram transformadas.
Reinaldo Wolff: O que representa a fé em sua vida?
Indiara Nunes: A fé? Eu acredito que é a base da minha existência. É como acreditar que existe o oxigênio (não vemos o oxigênio) mas é o que me mantém viva!
Reinaldo Wolff: E o que levou a escolher esta profissão que você está querendo?
Indiara Nunes: Fisioterapia? Foi - eu acredito - encaminhado por Deus. Porque? Meu sonho era fazer Direito. Eu queria ser advogada. Eu sempre quis trabalhar como voluntária. Uma área que eu gosto muito é História. Então eram essas áreas de estudo que me interessavam. Só que... Eu estava em Salvador - e quando eu cheguei lá, fiquei dois anos procurando emprego. Eu não conseguia emprego! Estudei em colégio bom. Não que eu me julgasse melhor, via pessoas que não tinham o mesmo conhecimento que eu, elas não tinham o ensino médio... Mas aquelas pessoas conseguiam emprego, e eu... não conseguia! Aquilo me deixou muito triste. Um dia fui fazer uma entrevista no Edifício Torres do Iguatemi. E eu não consegui passar na entrevista! Eu sentei... Em frente do Iguatemi tem uma praça... Eu fiquei lá e chorei uma tarde inteira! Nesse momento eu decidi voltar pra casa, em Cachoeira. Foi aí que eu vim embora. Quando eu cheguei em casa da minha “vó”, eu ouvi um carro de som anunciando o vestibular da faculdade. Eu falei: “Nossa! Não tenho um tostão, nenhum dinheiro nem da passagem!” (mas foi tudo acontecendo certinho...). Eu falei: “Vou me inscrever”. Só tinha fisioterapia. Área de saúde. Mas isso até então não era nada do que me interessava. Eu me inscrevi no curso. Aí a minha vida mudou! Porque? Antes de entrar no curso, fui falar com a direção da escola. Fiz uma redação que já era a prova de segunda chamada, num domingo. Terça-feira peguei o resultado: passei! Nesse dia inteiro tentei conseguir um dinheiro para pagar a faculdade. Lá eles me disseram assim: É um mil e pouco para conseguir se matricular e pagar o primeiro mês. Só que eu não tinha. Fiquei desesperada. Eu falei: “Eu vou estudar agora sim!”. A minha tia me ligou: “Soube que está querendo estudar. Eu tenho o seguro desemprego. Tenho R$ 600,00”. Eu voltei e falei com o responsável da faculdade: “Não tenho como estudar, por um mil. O que eu posso fazer?” Ele disse: “Se você trouxer R$ 600,00 está matriculada”. E minha tia me deu R$ 600,00 do seguro desemprego dela. Eu entrei no curso assim “do nada!”. Foi na sexta feira que cheguei de Salvador, sem nenhuma perspectiva de melhora. Domingo fiz a prova. Terça-feira peguei o resultado, fiquei correndo atrás de dinheiro. Quarta-feira entrei na faculdade. Então: “assim do nada!”. E quando eu cheguei no laboratório, a primeira coisa que eu vi, que nós tivemos aula, foi sobre o coração. E quando eu vi o coração... Eu me apaixonei. Eu pensei: É isso aí!
Reinaldo Wolff: Qual a sua preocupação no momento?
Indiara Nunes: Eu me preocupo muito com a minha família, minha mãe, minha avó. Minha mãe trabalha muito. Ela recebe uma pensão do meu pai, morto desde quando eu tinha oito anos. Minha mãe trabalha demais! Eu tenho essa preocupação com ela. Eu moro longe. Mas porque? É mais barato, e mais viável. Ficar próximo de onde tem biblioteca, eu posso acessar internet de graça.
Reinaldo Wolff: E o que você espera resolver com seu trabalho de fisioterapia?
Indiara Nunes: Se eu conseguir melhorar a vida de uma pessoa - é bastante.
Reinaldo Wolff: Sente que é a sua missão, o seu ideal?
Indiara Nunes: Se eu fizer para o irmão, o que eu gostaria de receber - eu me sinto muito melhor.
Reinaldo Wolff: E você não gostaria de fazer o seu trabalho aqui no Brasil?
Indiara Nunes: Aqui é pouca mão de obra. Lá fora - é nenhuma! Essa é a diferença que eu vejo. Nós aprendemos tratar cada paciente pelo nome.
Reinaldo Wolff: Assim é o nosso trabalho jornalístico. Ver o lado mais humano das pessoas.
Indiara Nunes: Exatamente. O lado humano.
Reinaldo Wolff: O que é mais importante para você?
Indiara Nunes: O mais importante? Deus.
Reinaldo Wolff: Das coisas que está fazendo, qual a prioridade?
Indiara Nunes: Os meus estudos. É ajudar minha mãe a me manter na faculdade. Os gastos excessivos que temos. O aluguel que é caro. Conseguir me manter e prosseguir os estudos.
Reinaldo Wolff: E essa mudança de vida que é ir para a África? Como é que você vê essa mudança tão grande?
Indiara Nunes: Primeiro, muita dificuldade de adaptação. Tem muitos alunos da África na faculdade. Que me falam como é lá. Mas mudar... Aqui eu ainda tenho mordomias. Na minha casa eu tenho uma cadeira onde me sentar, eu tenho um lugar, uma família, uma cama, um armário. E minha mãe que está sempre ali. Eu e minha mãe, nós somos assim - nós já tivemos muitas divergências (já bati muito de frente) - mas minha mãe (sem ela...) ela é aquela pessoa dura. É aquela rocha. Aquela pessoa que está sempre lá. Mesmo que parece que o mundo está caindo. Ela está sempre firme. A gente sempre encontra ela lá.
Reinaldo Wolff: Ela não precisa de fisioterapia? É uma pessoa forte e saudável?
Indiara Nunes: Sim. É forte e saudável.
Reinaldo Wolff: Sendo uma pessoa de fé, como você vê a possibilidade de um cataclisma no Brasil?
Indiara Nunes: Pelo que eu entendo, não haverá tão cedo. Jesus ainda tem que voltar.
Reinaldo Wolff: Como é que você define o povo baiano?
Indiara Nunes: O baiano é aquele povo que se alguém chegar na casa dele e tiver só feijão, ele vai pôr mais água no feijão, vai encher de farinha e vai te dar o que ele tem. É um povo alegre. Vai muito a festa. Tem um preconceito de que baiano é preguiçoso. É o povo mais trabalhador que há. Baiano faz festa com tudo. Mas isso não é ser preguiçoso. Trabalha a semana inteira. E no final de semana ele agüenta fazer festa porque é forte. Está cheio de energia e alegria.
Reinaldo Wolff: E o povo africano é triste?
Indiara Nunes: Muito alegre. Há regiões da África, dizem ser lindíssimas. Tudo colorido.
Reinaldo Wolff: O que acha do treinamento que está recebendo? É de excelência?
Indiara Nunes: Já temos o reconhecimento da sociedade. É pelo amor que temos pelas pessoas.
Reinaldo Wolff: E quais os possíveis riscos que tem que evitar, pois são os que ainda lhe preocupa?
Indiara Nunes: É quando chegar na prática profissional, de perder a visão do ideal. Todo estudante de medicina quando eles entram... “Ah! Porque você quer ser médico?” - “Quero por ideal, é o primeiro amor. Quero ajudar”. Mas na prática, na vida real, as pessoas que entram num consultório, o médico mal olha para as feições do paciente.
Reinaldo Wolff: Então é não perder o foco no ideal?
Indiara Nunes: Eu quero trabalhar numa instituição que leve o amor de Jesus. Uma instituição que tenha autonomia de, além de tratar o físico, tratar o espiritual. O bem estar é um conjunto. Bem estar físico, mental e espiritual.
Martha Wolff: O motivo de nossa entrevista é que vemos em você empolgação pela vida, paixão pela escolha profissional, amor à família. Nossos votos para você: Manter a fé e não se deixar poluir.
Reinaldo Wolff: Há momentos que você vai precisar de muita coragem. Serão momentos em que você vai sentir a necessidade do insight, do mergulho dentro de si. Encontrar paz dentro de si para poder fazer frente ao desafio, e ultrapassá-lo.
Indiara Nunes: Obrigada. Muito obrigada pelo seu conselho!
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Ela
almoçou conosco sob a sombra das árvores e ouvindo o canto dos pássaros típicos
do Rio de Janeiro. E trouxe para nós a sua mensagem da Bahia: alimentação saudável
e natural. Conhecer o valor dos alimentos naturais. Cabeça cheia de sonhos,
pensando no futuro.
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Entrevista realizada em 06 de julho de 2012
Foto e editoração: Arthur Wolff
* Matéria originalmente publicada em 07 de julho de 2012, conferida e atualizada.
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